A picanha da JBS aos domingos ou uma vida “normal”? A escolha não parece difícil. Mas a questão é muito mais profunda e a chance de falsas soluções é grande
Todos os domingos, por volta de 13h, começa o ritual. Tudo que preciso fazer é colocar a cadeira no quintal e esperar pelo cheiro. Que vem de um lugar, de dois, de três. Primeiro, o carvão. Em seguida, a gordura queimando no fogo. Não precisei acender a churrasqueira nenhuma vez em cinco meses de quarentena para passar por essa experiência.
Na fase mais estrita do isolamento social, um pequeno passatempo em família. Depois, enormes e barulhentos reencontros entre amigos, rompendo com todo bom senso imaginável, com som alto e, talvez, celebrações a cada renovação do recorde de mortes (no último domingo, 110 mil).
Apenas uma entre tantas evidências de que há uma brutal falha de comunicação ou de interpretação sobre as causas e as consequências da pandemia. Ou um gigantesco foda-se. Para ficar apenas no mais óbvio, trabalhadores de frigoríficos (e seus familiares) estão entre as maiores vítimas da pandemia em vários países.
No Brasil, a indigência estatística nos deixa sem saber exatamente quantos, mas, em cidades que têm o azar de abrigar essas instalações, a proporção de infectados é brutalmente maior.
Seria motivo suficiente para dar uma freada no consumo daquela picanha da JBS. Mas não vamos colocar tanto peso nas costas dos indivíduos. Olhemos para as estruturas.
O ônus deve recair sobre as decisões que nós humanos tomamos para organizá-los [os animais] dessa maneira. E, quando dizemos “nós”, sejamos claros, estamos falando de como o agronegócio organizou porcos e aves.
Essa frase foi retirada do livro Pandemia e agronegócio, que será lançado em breve pela Editora Elefante.
O livro reúne artigos do epidemiologista evolutivo Rob Wallace. Ele avisa desde a metade da década passada que viveremos uma pandemia graças à maneira como estamos criando animais para consumo humano. Sim ou sim.
A matemática é surpreendente.
Os governos do mundo estão preparados para subsidiar bilhões e bilhões para o agronegócio, destinados ao controle de danos em forma de vacinas animais e humanas, Tamiflu, operações sanitárias de abate e sacos para corpos. Juntamente com a vida de milhões de pessoas, o establishment parece disposto a apostar grande parte da produtividade econômica do mundo, que sofrerá catastroficamente se uma pandemia mortal surgir, por exemplo, no Sul da China. (CLIQUE AQUI PARA LER A MATÉRIA COMPLETA)