Por João Peres no O JOIO E O TRIGO
Se você gosta de Estado mínimo, melhor parar de olhar para os Estados Unidos e entender o que aconteceu com a vida e a alimentação no México.
Se você clama por livre mercado olhando para os Estados Unidos, é bom baixar um pouquinho os olhos. Mas não muito. Ali, onde o vento faz a curva pra voltar com mais coragem, tem um país chamado México. Essa turma, sim, adotou com gosto e orgulho a cartilha do livre mercado. Os vizinhos de cima só fingiram. O resultado? Tragédia.
O interessante da história, ou o horripilante, é que o Brasil de 2020 se parece mais e mais com o México dos anos 1990. Quanto mais lemos sobre as consequências do desmonte mexicano, mais temos dificuldade em enxergar uma luz no fim do túnel brasileiro. Pelo contrário. Somos um barco que ruma bestamente ao iceberg.
Essa é a terceira vez que falamos sobre o caso do país norte-americano. E não é por um acaso: é porque cada passo do governo Bolsonaro faz a situação ficar mais parecida e mais previsível. A relutância da equipe econômica de Paulo Guedes em mudar de caminho mesmo em meio à gigantesca crise causada pelo coronavírus só faz acelerar o passo.
Da primeira vez em que fui ao México, em 2018, não foi difícil notar que estava olhando para um espelho que mostra o futuro do Brasil. A precariedade laboral está em cada canto. As pessoas se viram como podem. Acumulam bicos e mais bicos. Vendem coisas pela rua.
A comida está por todas as partes. A boa, sim, maravilhosa, com muitos elementos frescos e vibrantes. Com a pimenta, jogada até nas frutas. Mas especialmente a ruim.
Os fast food a cada canto, de megaempresas ou de barraquinhas. Muito, muito ultraprocessado comercializado em quiosques, mercadinhos, bodegas, farmácias, hipermercados.
Só para recapitular, alguns dados sobre o México de hoje:
- O sobrepeso chega a mais de 70% da população, com 32,8% de obesos
- 80 mil mexicanos morrem de diabetes tipo dois por ano. A doença avançou em média 2% ao ano nas últimas duas décadas, e agora é a principal enfermidade causadora de mortes no país, seguida por problemas cardíacos e renais, igualmente associados à alimentação.
- 41,9% da população em situação de pobreza e 7,4% em extrema pobreza A média salarial aumentou apenas 4,1% nos últimos vinte anos.
E o Quico?
Daqui por diante, as semelhanças começam a jorrar do solo. O Brasil adotou uma agenda ultraliberal desde as manifestações de junho-julho de 2013. Houve variações de intensidade, de um ritmo menos rápido até 2016, durante o governo Dilma Rousseff, a uma aceleração na gestão Michel Temer, e a algo vertiginoso e inclassificável no mandato de Jair Bolsonaro.
Em 2014, 4,5% da população vivia abaixo da linha de extrema pobreza, segundo o IBGE. Em 2018 já eram 6,5%, chegando a 13,5 milhões de pessoas, ou 4,5 milhões de pessoas a mais.
A promessa da reforma trabalhista de criar mais e melhores empregos era conversa para boi dormir. Disso já sabíamos.
Nos últimos dois anos, foram criadas subocupações computadas como vagas de trabalho. Em 2018, de novo de acordo com o IBGE, a renda do 1% dos trabalhadores mais ricos avançou 8,4% frente ao ano anterior, enquanto o estrato mais pobre da população perdeu 3,2%.
Na soma, um em cada três brasileiros perdeu rendimento salarial.
Isso significa que o 1% mais rico concentra agora 34 vezes mais que os 50% mais pobres. E note-se que nós estamos falando de trabalhadores.
Não começamos a falar de patrões, de empresários, de rentismo.
Ladislau Dowbor, professor da PUC e autor de A era do capital improdutivo, resume essa outra face, ainda mais cruel, da história:
“Em 2012, tínhamos no Brasil 74 bilionários, que dispunham de uma fortuna total de 346 bilhões de reais. Em 2019, são 206 bilionários, com uma fortuna total de R$ 1.205,8 bilhões (17,7% do PIB brasileiro).
Como se acelerou de maneira tão dramática o enriquecimento dos bilionários no Brasil? Implicaria, imaginamos, um crescimento dinâmico da economia? Sabemos, na realidade, que desde 2013, que é quando, com manifestações e boicote, começa o ataque generalizado ao modelo distributivo, o PIB do Brasil não só não cresceu como, depois de dois anos de recessão em 2015 e 2016, continua paralisado. Estão, para dizê-lo claramente, se entupindo de dinheiro. Não ver a relação entre o enriquecimento dos mais ricos e a paralisia da economia sugere analfabetismo econômico.
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