Por: Tárcio Oliveira
Dois homens armados, numa motocicleta, fizeram na terça-feira dia 07 uma sequência de assaltos rápidos nos três postos de combustíveis da cidade (clica aqui pra ler reportagem a respeito). O montante roubado era pequeno e eles conseguiram fugir. A repercussão foi grande, espalhando-se pelas redes sociais tão rápida quanto a ação dos assaltantes. O crescimento do medo e da insegurança são conseqüências imediatas desse tipo de acontecimento que infelizmente vem se tornando cada vez mais corriqueiro na região.
A mim, quero confessar, causa mais temor e tristeza o que leio nas redes sociais após esses assaltos que propriamente a gravidade dos delitos. As pessoas comentam e cometem uma espécie de tiroteio a esmo, baleando lógica, ética, bom senso. Pelo que escrevem deduzimos que a sociedade é a vítima e Ninguém é culpado de nada, a culpa é como sempre dos governantes (eleitos por quem?), da falta de leis e de justiça (cobradas e fiscalizadas por quem?), da falta de policiamento (será que um em cada esquina resolveria?) e, claro, dos bandidos. Aí começam as soluções estarrecedoras: “Tinham que atirar pra derrubar esses bandidos” “Tem que matar” “Bandido bom é bandido morto” e para coroar o desfile de frases fascistas, alguns ainda acrescentam: “Bolsonaro 2018”. Claro, pois o remédio de um bandido é outro no poder. Ou, “olho por olho, dente por dente”.
“Bandido bom é bandido morto” virou mantra. Mas não é uma frase original, deriva de outra frase impiedosa e nada cristã, usada de modo recorrente no processo violento e desumano de ocupação das terras brasileiras com o massacre de populações inteiras de indígenas, incluindo crianças, mulheres e idosos: “Índio bom é índio morto”. A história da formação deste país é tão sangrenta quanto desconhecida pela maioria de nós. Não fomos um povo pacífico e banhamos com sangue de índios, camponeses e mulheres as terras brasileiras. Teremos dificuldades em localizar algum território habitado sem um passado de histórias de lutas desiguais e massacrantes.
O vencedor de ontem e de hoje impõe seu velho lema na guerra do nosso tempo: “Bandido bom é bandido morto”. Agora a presença incômoda, suja e ameaçadora que precisa ser combatida a ferro, fogo, balas e grades é o “bandido”. E repete-se o slogan com a mesma naturalidade com que se consome a hóstia na missa do domingo ou uma ave-maria antes de deitar-se: “Bandido bom é bandido morto”.
Só que a frase é confusa, pois embora queira generalizar, não se aplica a todos os bandidos, ou seja, àquelas pessoas que infringem a lei, que cometem crimes.
O bandido de que se fala é o bandido pobre, o pé de chinelo, o noiado, o favelado, o negro, o sem escolaridade. Esse é o bandido que merece morrer, sobre quem a polícia ou qualquer cidadão “de bem” pode descarregar suas armas.
O bandido rico, o empresário que corrompe, sonega, lava dinheiro e compra políticos NÃO. O político que desvia verbas, rouba dinheiro de saúde, da educação, da merenda, das obras e do saneamento, esse NÃO. O empreiteiro que superfatura obras e constrói paredes com material de terceira que se desmancham com facilidade, esses também NÃO. O ídolo que sonega impostos, bate na mulher ou manda que a matem e joguem o corpo aos cães, NÃO. O negociante que sonega impostos, contrata sem carteira assinada, não paga o salário mínimo, vende mercadorias sem notas ou superfatura preços, também NÃO. O pastor que recebe propinas e lava milhões de dólares na sua igreja, esse também NÃO. Os senadores, deputados e vice-presidente golpistas e denunciados por receber milhões em propinas, esses bandidos NÃO.
Não tem que matar ninguém, nem o bandido pobre nem o bandido engravatado.
Matar é um ato violento extremo, a supremacia do abuso sobre a existência de outra criatura. Não matarás é um dos primeiros mandamentos cristãos embora um dos mais desrespeitados, pois que até Jesus morreu não de velhice mas de “morte matada”, injustamente condenado. No entanto Matar parece ser inerente ao instinto humano: matamos por medo, prazer, ciúme, inveja, vingança, ódio, cobiça...por tudo matamos. Desde insetos pequenos que nos incomodam, animais que nos alimentam ou nos servem até os rios, árvores e solos que nos sustentam!
Parece óbvio: Já que matar é um componente tão natural da nossa espécie, por que não haveríamos que querer matar aquilo que não consideramos nossos iguais, que não consideramos nem humanos: os bandidos. Mas nenhuma sociedade se mantém de pé sem o alicerce da lei e do respeito à dignidade humana. Não se faz Justiça com as próprias mãos, o nome disso é vingança, abuso de poder. Justiça de verdade requer um sistema de leis, proteção, punição e recuperação que nos elevem à condição de criaturas superiores e não de animais irracionais movidos pelo ódio e pela sede de sangue.
Numa frase: bandido bom é bandido preso. E prisão útil à sociedade é a prisão que recupera.
Tuparetama-PE | março, 2017
[]
[]